A cadeira

A Madrastra, 1970 da pintora Paula Rego


Sento-me na cadeira que não me pertence
Os olhos dela deslizam, lentos, nas minhas costas
o couro quente agarra-se à minha pele nua.

Ela faz das suas mãos uma prisão
e eu cedo, com o corpo a pulsar, ao seu toque frio.
A noite pesa nas janelas, mas não falamos de luar.

Ela aproxima-se sem medo de errar.
As unhas dela marcam, cravam-se no músculo
um ensaio de poder nas pontas dos dedos.

Não preciso de gritar, há silêncio que basta.
O quarto veste sombras e o ar fica preso
ela ocupa todo o espaço, um trono e nada mais.

O som das roupas caindo no chão rouba a atenção,
mas ainda não fomos longe o suficiente.
Os lábios dela encontram a pele, e não há revolta.

O desejo é o que sobra depois da queda,
quando as mãos desatam os nós que ela apertou.
E eu, sem medo, aceito essa derrota.

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